27 maio 2009

Ponta Seca


Onde finco o pé no chão
Centro a ponta do compasso
Traço um mundo – ilusão –
Coração me foge ao braço!

Linda e louca, uma paixão
Descentrou-me do espaço
A descentralização
Fez-me então ser tão escasso

Um destino à minha mão
Outro longe do que faço
Inquilino da emoção
Vejo flores onde passo

Mas se abraço a solidão
Minha vida foge ao laço
Vivo assim, entre a razão
E um poema que amasso....

Roberto




De vez em quando, eu me arriscava a te esquecer
e quanto mais tentava, menos eu esquecia!
Como um menino, tentando esvaziar o mar
com um pequeno balde, jogando a água na areia!
Quanto mais eu desviava o pensamento, para dissimular
mais eu via o teu sorriso na transparência do vento, a soprar!
Então eu fechava os olhos, me fazendo lembrar
de coisas que nunca aconteceram, em nenhum momento
como quando eu pedi uma cigana, para gravar
o teu nome na palma da minha mão
mas ela disse que não, pois ele já estava lá
embaraçando a linha do meu coração!
E quando eu abria os olhos, eu ainda te via
em qualquer direção que eu olhava, o dia inteiro!
Já vai para o segundo janeiro, em que eu fico assim
me sentindo um pudim, esquecido na geladeira!
Ou ainda um piromaníaco pinguim
tentando feito um louco incendiar a geleira...




Roberto

Lua adversa




Tenho fases, como a lua
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha


Fases que vão e que vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.


E roda a melancolia
seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases, como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...



Cecília Meireles

26 maio 2009

Retrato


Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.


Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida a minha face?




Cecília Meireles

24 maio 2009



O azul carmim desbota ao tempo,
Segundos passam apressados,
Dois marujos bebem na margem do cais...
Aguardo o trem último chegar,
Ensaio pequenos versos...
Encontro momentos passados,
Tua foto sorrindo na roda gigante,
Nosso caminhar pelos pomares floridos,
Sinto o perfume das flores,
Sinto teu perfume chegando,
Vejo duas meninas abraçadas,
Percebo a lua cheia na clareira dos prédios,
As horas passam, os carros navegam pra longe,
A espera infinita me faz companheira,
Bebo uma dose recostado nas pilastras,
Pichadas,
Procuro seu nome...em vão...
Nossas marcas de outrora foram apagadas,
Corações românticos e juras de amor,
Ficaram na saudade da lembrança...
Meninos brincam de bola de papel,
Prostitutas vagueiam pelos cantos,
Fico imaginado você chegar...
De olhar feito brisa de verão,
Jeito tímido de riso da manhã,
Trazendo na bagagem teus sons a reboque,
Meia dúzia de versos líricos,
Todos lindos...todos absolutos...
Simples dizeres...profundos contrastes...
O trem último passa,
Pessoas se vão..somem na penumbra,
Não lhe vejo chegar...
O trem fica solitário...a estação fica vazia...
O silêncio parece um eterno infinito,
Vou caminhando sozinho,
Esboço um riso a deriva,
Talvez amanhã,
Você chegasse, no trem último...


noiTe

21 maio 2009

Sombras e Poesias




Vento forte que agora sopra,
impiedoso és com as folhas secas.
Amareladas e frágeis se equilibram
num fio de vida que ainda resta,
aresta de um tempo que se fora,
onde o ar clorofilado reinava.


Brisa impetuosa que abala,
sua melodia remete
aos cantos fúnebres de saudade.
Vejo as folhas secas pelo chão,
suas hastes estalam sob os pés,
restos da vida macerado, moído.
Folha que fora, hoje ruído,
do seu triturar, é só o que és.


Aragem que desliza por entre as copas,
a leveza das folhas me lembram
os sonhos alegres que tive.
Mesmo sendo noite, os sonhos luziam
então veio o sol, luz que as sombras dissipam,
que apaga o brilho das fantasias.
Dos sonhos sonhados restaram sombras e poesias.




k4akis

Caixa de Pandora




Pensamentos e pensamentos me atrapalham os pensamentos
Devaneios sobre o passado atrapalham algumas lembranças
Restringindo minha vida a curtos períodos de vida
Onde fico esperando a gravidade ficar contrária


Torço pra que a terra gire no sentido contrário
Que o sol se apague e que a lua me sustente
Espero que os mares cubram a minha cabeça
E que crie guelras pra aprender a conviver em outros meios


Olho para baixo tentando encotrar nuvens
Tenho impressões de que elas estão ao meu redor
Da minha boca saem palavras belas...mortas
Prontas para serem escritas na lápide de um indigente


Radicalmente afastado do mundo
Rompendo a barreira da solidão


E assim começo a viajar dentro de uma pessoa insuportável
Um eu que está começando a me prejudicar
Mas que todos tem em comum


Cada um com sua Caixa de Pandora.


19 maio 2009

Solidão



Solidão é olhar pela janela
E ver a multidão se rastejando
É estar cercado de gente
Ocupada o suficiente
Para não olhar ao seu sorriso

Solidão é nevar durante o ano todo
Aquela geada impiedosa,
A ponto de congelar o fogo
E trincar o coração,
Sem nenhum agasalho para vestir

Solidão é ver as vigas de sustentação desmoronarem
E não fazer nada;
Querer dormir.

15 maio 2009

Eu poeta




Sei que no fundo nada do que eu vejo existe
o mundo inteiro se converge em ilusão.
No descompasso entre a existência e a razão
na minha mão, meu coração bate tão triste...

Sei que não faço tudo aquilo o que eu faria
se por um dia eu fosse eu inteiramente.
Na qualidade de interino permanente
abraço a fraude de viver em poesia...

E nessa vida que eu sei que é provisória
vou emitindo promissórias sem valor.
Num desamor a minha vil mas própria história

escrevo a mim qualquer jardim que tenha flor!
Notoriamente o eu poeta é a escória
da fundição do eu normal e a sua dor.....



Roberto

13 maio 2009




Ainda me restam amores...
Com seus nomes escritos,
Nas bordas das páginas,
Que volte e meia visito,
Para lembrar momentos,
Viveres de ontem,
Jamais esquecidos...
Lembro das brincadeiras,


Dos primeiros beijos,
Nossos segredos,
Nossas alegrias de criança,
Correrias pelas areias,
Fazendo castelos, sonhos...
O mar todo nosso,
A lua chegando a nos acompanhar,
Com seu véu brilhante,
Os pescadores e suas redes,
Estávamos alegres no vai e vem
Das ondas...
Ficaríamos por infinito no tempo,
Assim...
Abraçados, confidentes das caricias,
Sorrindo simplesmente o passar do tempo,
Amigos, amantes soberbos, loucos apaixonados,
Divagando nossas fugazes percepções,
Descobrindo os lugares de cada um,
Seus segredos, seus jeitos,
Nossos sabores...




noiTe

Olhos Castanhos avulsos



O indizível
O irrefutável
Por entre traços doces e simples
De seu sono
Pela força de tantas quimeras
É que dizem tanto
E tanto
Que talvez
O mais dito
As palavras mais fortes
Se tornam
Poemas de amor
Poemas de suicidas
Poemas que trazem
As coisinhas mais simples
Reveladas nesse teu jeito
Nesse teu sono
Nesse poema de paz
Que a nada revela
Mas revela tanto...



Marcel Rei


Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino.
E eu me sinto completamente feliz.
Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas,
que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem,
outros que só existem diante das minhas janelas, e outros,
finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.



Cecília Meireles

09 maio 2009

Jaula


Quatro paredes
Elas falam
Gritam
Gemem
Ao mesmo tempo

Quatro paredes
Elas me cercam
De todos os lados
Sem saída
Há apenas uma porta
Que me traz coisas que não quero conhecer

Amor
Odio
Amizade
Sofrimento

Pra que tanto sentimento?
Pra que tanta satisfação ao coração?

Quatro paredes
Elas são mais que o suficiente
Companhia para a eternidade
Talvez um dia eu as pinte
Só para variar um pouco
Mas só passarei a primeira mão
Se não gostar, posso restaurar a parede antiga

Mas espere...há um furo na parede
Um olho mágico
Mágico olho que observa o mundo
Mágico olho que me mostra ao mundo

Sou um animal
Enjaulado
Preso no submundo de paredes
Num submundo de medos e impedimentos

Vivo dentro de minha razão!

06 maio 2009

Desejos


Desejo a você
Fruto do mato
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor
Sábado com seu amor
Filme do Carlitos
Chope com amigos
Crônica de Rubem Braga
Viver sem inimigos
Filme antigo na TV
Ter uma pessoa especial
E que ela goste de você
Música de Tom com letra de Chico
Frango caipira em pensão do interior
Ouvir uma palavra amável
Ter uma surpresa agradável
Ver a Banda passar
Noite de lua Cheia
Rever uma velha amizade
Ter fé em Deus
Não Ter que ouvir a palavra não
Nem nunca, nem jamais e adeus.
Rir como criança
Ouvir canto de passarinho
Sarar de resfriado
Escrever um poema de Amor
Que nunca será rasgado
Formar um par ideal
Tomar banho de cachoeira
Pegar um bronzeado legal
Aprender um nova canção
Esperar alguém na estação
Queijo com goiabada
Pôr-do-Sol na roça
Uma festa
Um violão
Uma seresta
Recordar um amor antigo
Ter um ombro sempre amigo
Bater palmas de alegria
Uma tarde amena
Calçar um velho chinelo
Sentar numa velha poltrona
Tocar violão para alguém
Ouvir a chuva no telhado
Vinho branco
Bolero de Ravel
E muito carinho meu


Drummond

As sem-razões do amor


Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.


Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.


Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.


Drummond

03 maio 2009


No nó de mim,
Uma ponta de fio surge...
Se puxares,
Num mero fiapo firarei,
E como poderei eu,
Emaranhar nossos olhares,
Outra vez...



noiTe