16 outubro 2014

26 agosto 2014

CIDADE


Que será do homem
que não sustenta
a sua fome
com pão, leite, feijão e ar?


Nada é menos livre
do que a fome
que mata o homem
e nada é mais livre
do que a palavra
que a revela
sob o sal das horas


Que será sob a cidade
do homem
onde não há lugar
sequer às letras noturnas do luar
aos peixes claros da alma


Que será do menino
que vive nele
a idade é mineral
emocional
e o tempo
esse cadáver embarcado
nos enche de mau
cheiro e de morte
a nos salvar


a música da esperança
o eterno pássaro
de nossa herança


Que cidade é esta
que nos cerca de luzes
mas apaga o feltro
de nossa infância
a febre de nossa voz
e deixa-nos ancorados
às esquinas
fotografia de fumaça e neblina


Que homem é este
que não se sustenta
que a fome o come
a partir do nome operário

09 julho 2014

Ó mar salgado, quanto do teu sal


 

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.


Fernando Pessoa

Amar





Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar! Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...

Florbela Espanca

06 julho 2014

Acróstico


Presente especialíssimo da amiga Dalva Abrahão,
que também ilustra esse blog com algumas de suas poesias.

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18 março 2014

Mudam-se os tempos






Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.


Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.


O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.


E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto,
Que não se muda já como soía.



18 fevereiro 2014



Tudo sem nexo,
Sem sexo,
Sem lástimas,
Sem cor,
Sem dor...
Amanhã de manhã,
Comprarei dois pães,
Pegarei o jornal,
Darei comida aos gatos...
A rotina é uma cortina,
De meus lindos medos,
Ah esqueci a porta aberta,
Volto já...